Por iniciativa de deputadas e deputados da Frente Parlamentar das Estatais e das Empresas Públicas da Assembleia Legislativa do Paraná, aconteceu na segunda-feira (17/4) a audiência pública “A Copel é Nossa! Não à privatização”, que debateu o projeto de privatização da estatal pelo governo Ratinho Jr. e seus impactos na economia do estado.
Além das falas de parlamentares, do ex-governador Roberto Requião e representantes de movimentos sociais e sindicatos, especialistas trouxeram análises sobre riscos e possíveis ações ilegais do governo do Paraná no processo. Houve também, como encaminhamento, um de pedido de audiência com o presidente Lula sobre o tema e leitura de documento a ser entregue ao governo federal pedindo a revogação do decreto publicado por Bolsonaro que inclui as usinas hidrelétricas do Paraná na privatização. Além de ser entregue um abaixo-assinado com 40 mil assinaturas contrárias ao processo de privatização.
Coordenador do evento e da frente parlamentar, o deputado Arilson Chiorato (PT), destacou a importância da mobilização dos movimentos sociais e de conscientizar a população. “Hoje, vemos a história se repetindo, a farsa da venda da Copel e, desta vez, parece que estamos menos mobilizados que em 2001, mas ainda há tempo, tempo de acelerarmos mobilizações. Tempo de engajar instituições, tempo de defendermos o Paraná da rapinagem que nos ameaça”.
“Há dois anos não tivemos capacidade de resistir à venda da Copel Telecom, com a empresa privatizada, a qualidade dos serviços caiu, o patrimônio que era do povo do Paraná foi distribuído na forma de lucro para os acionistas estrangeiros. Não precisamos esperar nada diferente caso a Copel seja vendida, teremos uma empresa voltada apenas para a geração máxima de lucro para o mercado financeiro. Precisamos resistir. Precisamos nos fortalecer, precisamos tomar as ruas da cidade, as redes sociais, conversar com cada paranaense e mostrar às pessoas que a ameaça está próxima”, disse.
O deputado Arilson afirmou ainda que o objetivo da audiência foi defender outro modelo de Estado, fazer a defesa da estatal, e não do lucro. “Atualmente, grandes fundos de investimentos já são sócios da Copel. Exemplo mais emblemático é o Black Rock, ninguém aqui e nem o governador acredita que a Copel nas mãos do Black Rock trará benefícios para a nossa indústria e para o povo do Paraná. O governador só insiste na venda da Copel porque este é um governo que não gosta da coisa pública, que se sente bem em distribuir o que é do Paraná, entregar ao capital financeiro aquilo que a gente construiu arduamente”, afirmou.
Pela revogação do decreto de Bolsonaro
O ex-governador Roberto Requião defendeu que o presidente Lula revogue o decreto de Bolsonaro que muda as regras sobre renovação de concessões de geração de energia elétrica em casos de privatização. “Anulação do decreto não implica nenhum esforço do governo. Aqui no Paraná o decreto continua valendo e, por isso, Lula está pedindo que façamos essa pressão”, defendeu.
Os novos termos do decreto explicitam que a privatização pode ocorrer não somente por transferência do controle acionário, mas também por alienação de participação societária, inclusive de controle, abertura ou aumento de capital, com renúncia ou cessão, total ou parcial, de direitos de subscrição.”
Também o deputado federal Elton Welter defendeu que ocorra mobilização contra o decreto. “Como desenvolvimentista, sei do papel estratégico que tem uma empresa como essa. Lula quer mobilização e, como deputado federal, buscarei levar essa pauta para que possamos suspender a venda da Copel”, disse.
E o deputado federal Tadeu Veneri informou que, já nesta semana, acontecerá reunião com o ministro de Minais e Energia (Alexandre Silveira) para buscar soluções sobre o tema. “Teremos a reunião com o ministro e vamos buscar soluções com o governo. Nossa obrigação é dizer ao presidente Lula que apoie esse movimento”, disse.
Crime contra a população
Citando o exemplo que viveu dentro de casa, como filha de um copeliano, a deputada Ana Júlia Ribeiro (PT) afirmou que há um projeto de quebrar a empresa. “Vivi dentro de casa, meu pai é copeliano, e sei todo o processo de propositalmente quebrar uma empresa lucrativa e que dá retorno para a sociedade para então roubar a população paranaense. Adoecem trabalhadores, fazem então um discurso raso de que a estatal não está sendo mais produtiva para tentar convencer de que o caminho é a privatização”, afirmou.
Para o deputado estadual Renato Freitas (PT), é um processo criminoso semelhante ao que fizeram com a Petrobras. “É um crime que parece nem comover a imprensa e ainda não chegou à conscientização da população. A privatização da Copel se dá no mesmo processo de ataque a Petrobras, com discursos de que não estariam dando lucro, assim esvaziam atribuições dos trabalhadores para que depois eles apresentem a solução mágica que é a privatização”, destacou.
Outro modelo de Estado
Na opinião do deputado estadual Goura (PDT), o que está em jogo é o modelo de Estado. “O que o governador Ratinho Jr. defende é trazer lucros para poucos. Temos um avanço do modelo que quer privatizar energia, educação, meio ambiente, saúde”, afirmou.
Preocupado em fazer que o debate chegue à população, o deputado Requião Filho defendeu que se traduza de forma simples os riscos da privatização para diferentes setores da sociedade. “É preciso explicar, por exemplo, para o setor industrial, que a energia cara advinda de um processo de venda da Copel vai aumentar os custos, que uma tarifa mais alta vai comer os lucros dos empresários e, por fim, que vai doer no bolso da população me geral”, disse.
Movimento de 2001 como exemplo
O histórico movimento contra a privatização da Copel, ocorrido em 2001, que reuniu milhares de assinaturas em um inédito projeto de iniciativa popular, foi relembrado pela deputada estadual Luciana Rafagnin (PT), que era parlamentar à época. “A população se mostrou muito forte naquela época, dando origem ao projeto de iniciativa popular, fazendo parte da história da nossa estatal. Se vendermos a Copel, nós sabemos que, pelo histórico daquilo que conhecemos das privatizações, o estado perde o controle das tarifas, teremos tarifas altas, apagões, e terminam programas e projetos importantes socioeconômicos, educacionais e científicos”, citou.
Também o deputado Professor Lemos (PT) disse que o movimento deve servir de exemplo. “Mobilizamos o Paraná inteiro contra a venda da empresa. Naquela época, houve um projeto de lei com 123 mil assinaturas contra a privatização. A Alep foi ocupada por estudantes e movimentos sociais. Essa luta continua”, pontuou.
Convidado a falar sobre o processo anterior, o ex-deputado federal e coordenador do Fórum contra a Privatização da Copel de 2001, Nelton Friedrich, destacou a luta histórica. “Chegamos a 138 mil subscritores da primeira proposta de iniciativa popular, em tempo recorde, em menos de 5 dias úteis, foram 105 ações em juízo e a primeira medida limiar que suspendeu a venda da Copel”, relembrou.
“Nossa luta sempre foi contra a privatização, porém as condições são outras em relação àquela época. Vamos continuar defendendo o engajamento dos movimentos”, defendeu também o deputado estadual Dr. Antenor.
Riscos e Ilegalidades
Na segunda parte da audiência, análises foram apresentadas com dados e informações demonstrando os riscos do processo da privatização da estatal. Leandro Grassmann, presidente do Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge), detalhou os caminhos que vêm sendo seguidos pela atual gestão da Copel.
“Hoje, a Copel é guiada pelo que se chama Investimento Prudente. É todo aquele investimento em redes ou em geração, que é reconhecido pela Agência Reguladora e que, portanto, vai fazer parte da composição da tarifa. Aqui, a gente já derruba o argumento do governo de que a ANEEL que determina a tarifa. Não é. Quem determina a tarifa é a concessionária, pedindo a autorização da ANEEL. Na contramão do Investimento Prudente vem o Investimento Não Prudente, que não vai ser de reconhecimento pela ANEEL. Então, se der um defeito na minha casa, e eu moro lá no fim da linha de distribuição, se isso for impactar em indicador da Copel e isso não for trazer lucro, esse investimento não será feito. E eu coloquei lá mais dinheiro, menos custeio, menos investimento, porque é isso que a empresa faz. E tudo isso para quê? Mais lucros”.
Já Wagner Willian da Silva, economista da liderança da oposição, disse que aos poucos o governo vem abrindo mão da Copel. “A forma como esse negócio está se dando vai trazer prejuízos enormes para o estado, porque o governo já abriu mão do controle. Por exemplo, dois anos atrás foi feita mudança no estatuto da Copel que permitiu que as ações preferenciais votem nas decisões de grande relevância da empresa. Assim, o governo, aos poucos, vem abrindo mão da Copel”, explicou.
Do ponto de vista jurídico, o advogado Daniel Godoy disse que é preciso ainda ver esse projeto como uma intenção de privatização, já que existem muitas ilegalidades. “Quando o projeto de lei veio para a Assembleia foi verificado, por exemplo, total desconformidade com os princípios da publicidade, não acompanhando um demonstrativo dos impactos financeiros. Além disso, fizemos uma representação junto ao Tribunal de Contas e também sugerimos à AGU e ao BNDES que havia uma pretensão da redução compulsória do capital acionário do BNDES junto à Copel”, informou.
Encaminhamentos
Ao final da audiência, uma Carta aos Paranaenses contra a Privatização da Copel foi lida e aprovada como documento do evento. E, entre os encaminhamentos, o pedido por audiência com o presidente Lula, bem como a reivindicação de que o decreto federal de Bolsonaro seja revogado, além de reunião com o ministro de Minas e Energia e a realização de audiências públicas no Paraná.
Fernando Azevedo, engenheiro da Copel, ao final, entregou um abaixo-assinado com mais de 40 mil assinaturas contrárias ao processo de privatização.
Texto – Ana Carolina Caldas (Assessoria Colaborativa da Audiência Pública “A Copel é Nossa! Não à privatização”)
Fotos – Alep e assessorias/ Foto de capa da matéria, Eduardo Matysiak